O porto de S. Martinho, tal como
outros, encontrava-se limitado na sua normal operacionalidade desde finais do
Séc. XVIII devido ao assoreamento, para o qual, além das causas naturais, muito
contribuía o velho hábito de deslastrarem os navios dentro do próprio porto.
Isto levou a que, em 1817, D. João VI mandasse dar conhecimento, por portaria,
à Polícia do Porto de S. Martinho e ao Administrador dos Reais Pinhais de
Leiria que, “(…) relativamente aos lastros, visto mostrar a experiência, que
pelo intolerável costume de deslastrarem as embarcações dentro do mesmo porto,
se acha este quasi entupido, e a não se cohibir hum semelhante abuso, se
aniquilaria de todo, tornando-se inúteis os dispendiosos trabalhos, a que se
está procedendo para a restauração (…)” do porto. Por outro lado, no mesmo
documento, ordenava: “Os lastros de arêa ou terra serão levados nas lanchas das
embarcações ou à custa dos respectivos Mestres, ou Arraes, em quaesquer outros
barcos, para fora da Barra (…), na distância de trezentas, ou quatrocentas
braças do lado do sul, a fim de que as ondas os não arrastem outra vez para
dentro da mesma Barra.”.
Como se vê por este documento, no
Porto de S. Martinho procedia-se já, por essa altura, a trabalhos para
restauração da sua normal operacionalidade.
Em 1853, o Administrador Geral das
Matas Porfírio António Caminha, em documento citado por Arala Pinto em 1938,
dizia que “(…) Para se poderem extrair do Pinhal de Leiria a maior porção de
productos, já foi lembrado a construção
de um carril de madeira até ao porto de S. Martinho (…)”. Por outro lado,
Porfírio António Caminha lembrava também a falta de transporte marítimo para
escoamento dos mesmos produtos a partir dos portos de embarque, “(…)
considerando-se o pequeno número de hiates que havia (…)”.
Em finais de 1856, em resposta ao
Administrador Geral das Matas, a Direcção Geral do Comércio e Indústria
aprovava a construção de dois “hiates” e encarregava o Eng.º Joaquim Simões
Margiochi da elaboração do projecto do Caminho-de-ferro Americano. Ainda nesse
ano “(…) se expedia ao Administrador Geral o regulamento para a parte
administrativa e económica da construção do Caminho de Madeira do Pinhal de
Leiria ao porto de S. Martinho (…)”.
Sobre a construção do
caminho-de-ferro americano, Brito Aranha, escritor, jornalista e bibliógrafo
português, em 1871, dizia: “(…) começou-se em 1859 e concluiu-se em 1864 (…)”.
Ora, neste espaço de tempo, estará decerto incluída a primitiva construção
feita com carris de madeira que, dada a sua fraca duração, numa renovação
ordenada pelo Ministro das Obras Públicas, o Duque de Loulé, foram substituídos
por carris de ferro, importados em 1861 de Inglaterra juntamente com material
rolante, o que permitiu um melhor deslize.
Por a Real Fábrica dos Vidros se
encontrar fechada, por falta de arrendatário, os operários vidreiros tiveram
autorização para trabalharem na sua construção.
Este comboio fazia a ligação entre
Pedreanes e São Martinho do Porto, numa extensão de 36 km, passando em frente
da Real Fábrica dos Vidros e do edifício da Fábrica da Resinagem. Para São
Martinho transportava os produtos do Pinhal para embarque e, de retorno,
trazia, da Martingança, areia e calcário para a Fábrica dos Vidros e pedra e
cal para construção de estradas.
O comboio era constituído por nove
vagões de carga, transportando cada um 4500 kg, e um de passageiros. Nas
subidas era puxado por bois e nas descidas o seu próprio peso fazia com que se
deslocasse por si, por vezes velozmente.
Para além das principais estações,
Pedreanes e S. Martinho do Porto, havia também estações na Marinha Grande,
Martingança, Valado e Mouchinha, para muda e descanso dos animais.
A circulação deste comboio fazia-se
todos os dias úteis da semana. Demorava de Pedreanes a S.Martinho do Porto
cerca de seis horas e no sentido inverso oito horas. Deixou de pertencer à
Administração das Matas em 1866, passando a pertencer à Direcção das Obras
Públicas do Distrito de Leiria.
Os “hiates”, que complementavam o
transporte dos produtos do Pinhal a partir de S. Martinho por via marítima,
designados “Marinha Grande” e “Valado”, foram vendidos em 1867.
Em 1885, com o início da construção da Linha
de Caminho-de-ferro do Oeste, que aproveitou parte do traçado existente, o
Comboio Americano foi desactivado.
A estação principal, em Pedreanes,
mantem-se em posse do Estado, enquanto a estação de S. Martinho do Porto, há
muito propriedade privada, está presentemente em processo de remodelação.
Em 1888 chegariam à Marinha Grande
os comboios a vapor.
Adoro estas reminiscências!! Tão importante conhecermos a histórias das coisas e dos tempos!
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